As mudanças climáticas deixaram de ser uma projeção distante de cientistas e ambientalistas para se tornarem parte da rotina global. Secas prolongadas, enchentes devastadoras, ondas de calor extremo e eventos climáticos cada vez mais frequentes já afetam a economia, a saúde e a infraestrutura de países inteiros. O tempo da discussão teórica acabou. O desafio agora é de governança: quem decide, com base em que critérios e com que coragem para enfrentar os custos da transição.
A dificuldade é que a crise climática não respeita fronteiras, calendários políticos ou ciclos de lucro. Ela exige ações coordenadas e persistentes — justamente o oposto da lógica imediatista que domina boa parte da gestão pública e privada. A governança climática, portanto, é um teste de maturidade institucional. Implica reconhecer que certas medidas impopulares, como a limitação de emissões, a taxação de carbono ou a reestruturação de cadeias produtivas, são indispensáveis para garantir o futuro.
Empresas e governos ainda tropeçam nessa realidade. Muitos mantêm planos climáticos genéricos, sem metas claras nem mecanismos de auditoria. Outros prometem neutralidade de carbono até 2050, mas sem detalhar o caminho até lá. É o risco do discurso vazio: um simulacro de compromisso que adia as decisões difíceis. A governança verdadeira exige transparência, acompanhamento e responsabilização.
Tomar decisões difíceis significa lidar com trade-offs inevitáveis. Reduzir emissões pode aumentar custos de curto prazo; reconfigurar matrizes energéticas pode gerar resistência de setores tradicionais. Mas não agir é infinitamente mais caro. Os prejuízos de desastres climáticos, somados à perda de produtividade e ao colapso de infraestruturas, já superam em muito o custo da mitigação. O desafio é convencer sociedades e empresas de que prevenir é mais inteligente — e mais econômico — do que remediar.
Governança climática não é apenas tema ambiental. É questão de gestão de riscos e de reputação. Investidores globais já priorizam empresas comprometidas com metas reais de descarbonização. Fundos de pensão, bancos e seguradoras incorporam critérios ambientais em suas análises. Ignorar o clima é, cada vez mais, um risco financeiro.
No setor público, a ausência de governança climática se manifesta na falta de planejamento urbano, na ocupação irregular de áreas de risco e na ausência de políticas de adaptação. O poder público precisa liderar pelo exemplo: reduzir sua própria pegada de carbono, investir em infraestrutura verde e adotar critérios sustentáveis em contratações. A mudança cultural começa de cima, mas se consolida na base — nas escolas, nas comunidades e nos hábitos de consumo.
O papel das cidades é crucial. Elas concentram população, energia e emissões. Prefeituras que tratam o tema climático como prioridade estão à frente da curva. A transição energética, o transporte público eficiente e o uso racional da água são exemplos de políticas locais que, somadas, produzem efeitos globais. O combate às mudanças climáticas não é responsabilidade exclusiva de conferências internacionais: ele começa no nível municipal, onde as decisões afetam diretamente a vida das pessoas.
É preciso também repensar a comunicação sobre o clima. Durante anos, o discurso ambiental foi dominado por jargões técnicos e projeções distantes. Hoje, o público exige clareza e ação. O cidadão quer saber como as decisões climáticas impactam sua vida: no preço dos alimentos, na conta de luz, no transporte, na saúde. Traduzir o debate climático para o cotidiano é essencial para mobilizar apoio popular.
A governança climática é, em última instância, uma questão de coragem. Coragem para assumir custos políticos, rever modelos de produção e enfrentar interesses estabelecidos. O futuro não será definido apenas pelas inovações tecnológicas, mas pela capacidade de líderes — públicos e privados — de tomar decisões difíceis agora, em vez de empurrá-las para as próximas gerações.
As mudanças climáticas já estão em curso. A única dúvida é se teremos instituições suficientemente maduras para governar essa transição com justiça, eficiência e visão de longo prazo. A hora das decisões difíceis chegou — e adiar é, também, escolher.

